terça-feira, agosto 03, 2010

Do roubo

Larápio, sacana, cafajeste – clamou algo assim, não recordo bem. E tudo porque lhe roubei beijo; assim, de súbito, como tal ato aparentemente deve ser feito. E somente o fiz por ser este o mais notório dos ósculos, ganhando de qualquer outro tipo do gênero. Por quê? Ora, porque todos os outros são consentidos, são liberados, como por obrigação já bem compreendida do relacionamento. Mas o roubado, bem se sabe, não; o roubado não é seu; e mais, faz-se mais peculiar e tentador porque é o único roubo bom. Desviando do trâmite burocrático intrínseco ao relacionamento, revela total bravura, tal certa e aceita loucura. Mas o furtado, embora proposto, entendido superficialmente como ato súbito, lhe exige um distinto e prévio pensamento, certo preparo. Pondera-se, deste modo, então, situação, nível de adrenalina, movimentos certeiros e tudo o mais. Porque se assim não for feito, tal furto não consegue sua veracidade plena: a realidade. Não, não sucede, fica somente no planejamento, memória, adágio, desejo. E esse tal ato se faz mais notório porque, embora furtivo, carecerá, ainda, de obrigatórios e planejados argumentos bem fundamentados; pois o praticante, o larápio, será de toda certeza pego, flagrado. E tais argumentos bem cabem ser singelos ou mais elaborados, ou os dois, mas que sempre devem tomar os ares convincentes; como assim ponderei, como assim lhe argumentei, como deste modo, para boa sorte minha, ela compreendeu.